Sim, é verdade, Donald J. Trump é o 45º presidente dos Estados Unidos da América.
Para surpresa de muitos, mas não de todos, o candidato improvável, que foi descartado, ridicularizado e criticado, foi também o mais votado.
“Como é que ele ganhou?” é a pergunta de milhões à volta globo que encontra as respostas simplistas de “os americanos são burros”, “a sociedade está perdida” e “as pessoas não pensaram bem”. Mas a verdadeira resposta é que Trump, um marketeer e vendedor de excelência, mostrou ser um comunicador inigualável nesta campanha e provavelmente o melhor desta década.
No consagrar da sua nomeação republicana, em Julho, eu escrevi no meu mural de Facebook:
«O Trump é um caso sério. Mesmo.
É« um comunicador inteligente (quer se goste ou não do uso que dá à sua inteligência) que está a fazer três coisas que lhe trouxeram resultados:
«- Percebe que o “medo” é o mais poderoso motivador humano, e utiliza-o sem pudor.
«- Percebe que uma grande parte da sociedade não investiga o que alguém diz e por isso oculta e distorce a “verdade” como lhe convém.
«- Percebe como se conectar com o ódio, desespero e revolta de uma grande parte das pessoas, que são emoções muito poderosas.
«Nas primárias republicanas derrotou outros 16 concorrentes, sendo o candidato republicano nomeado com mais votos de sempre!!!
«Isto não é uma brincadeira. Isto é muito sério.
«E ou a sociedade americana acorda, começa a levá-lo a sério, a perceber como o vai derrotar e trabalhar para responder às questões das pessoas que o apoiam, ou o mundo vai ter muitos problemas.”
Detestavelmente, estava certo.
E o que é que Trump fez tão bem ao nível da sua comunicação?
1. Profiling do público-alvo
Durante os anos das administrações Obama e Bush, a classe média americana perdeu empregos, poder de compra, estatuto e sensação de segurança. O trabalho que foi feito na inclusão das minorias (negros, hispânicos, LGBT, etc.) não teve um trabalho correspondente na resposta às questões da classe média caucasiana.
Foi um período de grande revolução ao nível da indústria e serviços. Milhões de pessoas viveram situações de aperto, cidades inteiras “fecharam” (p. e. a situação crítica de Detroit), centros de produção foram deslocalizadas e, para tudo isto, as soluções apresentadas foram poucas.
Esta situação gerou um sentimento profundo de insatisfação com os “decisores económicos”, que continuaram a ganhar com o sacrifício de milhões; gerou, raiva contra o “sistema político instalado”, que nada faz para inverter a situação; e gerou ódio contra os “imigrantes ilegais” que retiraram dos “americanos” os poucos trabalhos que ainda existem.
A campanha de Donald Trump compreendeu muito bem estes sentimentos e que o número de pessoas que se ligava a eles era muito grande.
(para mais info, ver artigo da Foreign Affairs: https://www.foreignaffairs.com/american-political-decay-or-renewal)
2. Conhecimento dos media
Donald Trump é um entertainer por excelência e as suas participações em inúmeros programas de televisão e cinema ajudaram-no a compreender muito bem os meios de comunicação, principalmente os jornalísticos. Trump percebeu que os “jornais” seguem cada vez mais tendências e não noticias e valorizam mais as audiências do que a verdade.
É o grotesco que vende e são as frases de choque que aparecem nas manchetes. Por isso, Trump montou uma estratégia de frases-chave (“make america great again”), argumentos extremistas (“mexicans are thieves and rapists”) e ideias rocambolescas (“we are going to build a great wall and Mexico will pay for it”) que não só exprimiam muito do sentimento do seu público-alvo como foram destacadas pelos serviços noticiosos dando-lhe cada vez mais tempo de antena e protagonismo.
O “falem bem ou falem mal, o que importa é que falem” foi levado quase ao extremo e com excelentes resultados. Porquê? Porque ele sabia que os media eram percebidos pelo seu público como o “establishment” (sistema instalado) e sempre que falavam mal dele, Trump tornava-se ainda mais o “candidato do Povo”.
3. Conexão com o Público
Trump fez isso de forma brilhante. Ele conseguiu criar uma ligação fortíssima entre si e o americano comum ,que se acabou por identificar com ele. E não era tarefa fácil, pois o bilionário, playboy, nascido em berço de ouro e magnata de negócios (com várias fábricas na China) não podia estar mais longe do operário, do lutador pela família e do sofredor de condições adversas.
O “Make America Great Again” (tão forte como o “Yes, We Can”) representava de uma forma inequívoca o sentimento generalizado do seu público-alvo. É toda uma expressão patriótica, de esperança e revolta, concentrada na mesma frase.
Trump conseguiu tanto dar voz aos que sentiam que não a tinham, que mesmo as suas frases mais aberrantes eram celebradas como “não tendo papas na língua” ou no máximo “politicamente incorrecto” (e mais uma vez como anti-“establishment”).
(para mais veja: http://www.youtube.com/TrumpVideo)
4. Resposta a “Ataques”
Donald Trump foi um dos candidatos mais criticados, gozados e pessoalmente atacados da história eleitoral americana. E conseguiu tornar isso um ponto forte.
Em primeiro lugar, o público que se identificava com ele sentia os ataques como se a si fossem dirigidos, o que acicatava ainda mais ódio e afastamento por quem os fazia e a compaixão e apoio a Trump que os recebia.
Em segundo lugar, o publico em geral, e o seu em particular, tem memória curta e muita tolerância ao engodo. Logo, o povo deu pouca importância às contradições, as incorreções factuais e mesmo às mentiras, aceitando facilmente as explicações e as desculpas do candidato, que percebeu cedo que assim seria.
Em terceiro lugar, Trump utilizou de forma magistral a estratégia de “a melhor defesa é o ataque” e a Hillary Clinton tinha muita, mas mesmo muita, matéria prima para criticar.
5. Foco na Visão
É Simon Sinek que explica este fenómeno melhor do que qualquer outro que eu conheça. A generalidade das pessoas não “compra”, não liga e não se motiva por um processo ou uma ação concreta. As pessoas sentem-se inspiradas por um propósito por uma ideia ou um conceito do mundo em que elas acreditem também. (ver Tedx Talk de Simon Sinek: https://www.youtube.com/SimonTEDx)
É o “I have a dream” do Martin Luther King Jr., a “supremacia da raça ariana” do Adolf Hitler, o “Yes, We Can” de Barack Obama ou o “Think Different” de Steve Jobs.
As pessoas entusiasmam-se, compram e votam no “why” e não no “what”. O Trump captou os seus eleitores com o “Make America Great Again”, um “why” tão poderoso que se sobrepôs a tudo resto.
Foi a vitória da forma sobre o conteúdo, do comunicador sobre a comunicação, mas principalmente do habilidoso sobre a hábil. Daquele que conseguiu compreender, comunicar e influenciar, sobre aquela que estava mais qualificada para o lugar.
No mundo moderno em que vivemos, a capacidade de saber utilizar a comunicação eficaz e convenientemente é cada vez mais importante na prossecução dos resultados que ambicionamos.
Trump acabou de demonstrar este ponto ao mais alto nível.